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Ecologia e Poesia à Luz de João Barcellos
(...) a Cor interpretada pelo Cérebro humano não pode ser reproduzida (pelo menos por enquanto...) em sistema de impressão. A única ferra- menta, humana, que nos dá o poder de chegar perto dessas sensações é a Poesia. . João Barcellos in O Mundo Da Cor - VII (jornal O Serigráfico, Brasil, Julho/1997)
Um dia desloquei-me a Caucaia do Alto. Antes, precisei de passar por minha casa em Granja Viana, casa que era mais o retiro espiritual de meu saudoso pai que propriamente minha casa. Entre as cartas de mais de dois meses, empilhadas pela caseira, estava o livro de contos que João Barcellos produzira e do qual tive notícias por um jornal de São Paulo, quando cheguei de uma conferência em New York: O Jovem Poeta E O Grão De Terra foi o conto que mais impressionou o crítico que escreveu a nota do jornal. Sentei na cadeira de couro, ali perto, e li, rápida, esse conto. Queria algo para discutir com João Barcellos, pois estava indo a Caucaia do Alto, e só por isso, para assistir a uma palestra sua sobre Vinícius de Moraes. Dele, eu já tinha lido o rascunho de Carta Eco-Política De Um Poeta Amoroso (os rascunhos dele são já o texto definitivo, coisa impressionante) que iria incluir em um livro sobre as origens do nome Cotia e, com isso, mais um pouco sobre a História brasileira. Quando cheguei na sala de aula da escola secundária o conferencista acabava de ser apresentado por uma professora. Fiquei absorta. Já tinha lido e ouvido muito sobre o poetinha, mas nunca assim, de maneira tão poética e tão filosófica. O homenageado deve ter gritado do Além: Evoé, poetinha! Quando terminou a fase aberta ao público, muito rica nas palestras de João, disse-lhe: Continuas sendo uma usina de Cor e de Poesia! Os seus olhos sorriram e eu não precisei de mais nada. Já tinha a opinião, ecologicamente correta dada pela telúrica importância de um poeta que diz da Terra seu "berço e percurso". Encontro neste intelectual português aquilo que li na sua escrita sobre O Mundo Da Cor, op. cit., ou seja, o espectro poético das sensações sublimes da Vida totalizado em cada partícula elementar. Mas também, a essência da Ecologia Humana: "pensar e agir localmente pelo equilíbrio das naturezas que sustentam o nosso teto - o Cosmo". Aquele texto-aula publicado em sete partes no jornal O Serigráfico define muito bem a personalidade filosófica e científica deste escritor-editor. Seria muito difícil fazer uma leitura da vida e da literatura de João Barcellos de outra maneira. Ecologia, Ciência e Poesia são como pão nosso de cada dia para ele. Meu amigo e poeta João é dos poucos que me tira dos laboratórios e me faz escrever. Fazia frio e era noite escura em Caucaia do Alto. "Vinícius foi mais que vanguarda artística, ele foi o Brasil da esperança em luta por um espaço de ação concreta", disse-me ele quando pousamos em um barzinho para tomarmos um café, "e também, uma bandeira da Língua portuguesa sob Cultura brasileira", continuou. "Ih, ainda está contigo aquela professora bonita, não, pesquisadora de células? Ela vai para Manchester pesquisar, ou não?" procurou ele fogo para se queimar. Puxei fumaça e deixei que um círculo se formasse entre nós, e ele concluíu: "Ih, a isso eu chamo de intercâmbio de naturezas vivas em almas gêmeas". E eu ri. Nem tanto, pensei. Mas acho que ele adivinhou, porque sorríu ao tomar o último gole de cafézinho. Na parte VI de O Mundo Da Cor (O Serigráfico, Maio/1997), escreveu: "...somos uma fonte que se torna espectro do Todo colorido/luminoso que nos rodeia. Vivemos a Cor e nos aperfeiçoamos como Artistas-da-Cor". Poucos físicos, ou químicos, chegam a este nível de percepção. É preciso um Saber que está muito além da Física instrumental, um Saber que é aquilo a que chamo de Leitura das Sensações, ou, como ele diz, "a íntima vivência do poder espiritual, que é a nossa Luz". Mas ele é poeta e eu sou física, cronista de testes laboratoriais... e confesso que aprendi a escrever com ele. Já na Ganja Viana, em conversa que foi até cerca das três horas, notei que o poeta e conferencista estava cada vez mais ligado às questões da Ecologia pela ligação filosófica, pela busca do humanismo que a Humanidade perdeu há muito. "Vivemos uma nova Idade Média: a Educação não tem base de Cultura e serve apenas como instrumento para o emprego classificado. Carne pra canhão! Destróem o Eco-Sistema pela ganância do Poder e esquecem que pisam todos os dias em seus ancestrais ao derrubarem uma árvore que não será substituida, e ao pisarem seus ancestrais pisam no Cosmo, na Vida, nesta Poesia que nos ensina (lembras do Mário Quintana?) que só deveríamos morrer de puro amor...", dizia-me ele com a amargura da desilusão na voz. Por isso ele luta, nem sabe viver de outro jeito. A escrita é sua arma - escudo e lança de um quixotismo fantástico que ele dissemina entre O Serigráfico e o Jornal D'Artes com a intenção de servir a Humanidade. Continua sendo O Jovem Poeta E O Grão De Terra em busca de si mesmo, uma busca amorosa que envolve poeticamente os outros e o Universo. Os seus ensaios reunidos em Escritos Ecológicos, editados na Internet (Cotianet), são uma obra-prima do Pensamento hodierno e dinâmico. "Uma obra para ser lida com o dedo indicador erguido contra os políticos miseráveis que são o Poder da destruição humana", como diz a crítica Tereza de Oliveira em sua opinião. "Sou tão telúrico e cósmico quanto tu quando estudas as partículas elementares", disse-me na despedida com seu português castiço, enquanto autografava o texto Entre O Poetinha E O Canto Das Vanguardas. É muito gostoso saber que ainda existem poetas que lutam pela Vida, e como é bom estar perto deles para vivenciar as partículas dessa Energia cósmica! Joane d'Almeida y Piñon - física/psicóloga
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